Como seriam nossas opiniões, se
julgássemos a
nós, pelos erros e negligências que cometemos?
|
Recentemente, um fato chocou a sociedade
brasileira. Num ônibus, uma passageira se encontrava cochilando em uma das
cadeiras, quando fora acordada por um jato de sêmen, proveniente de um homem
que acabara de ejacular. Injustificável, reprobabilíssimo, constrangedor,
gritaram todos (inclusive eu). Gerou grande comoção social. Tal fato suscitou
uma série de discussões nos mais diversos grupos presenciais e virtuais,
sobretudo no ambiente no qual se encontram os maiores cientistas do planeta: o Whatsapp.
Mas, abstraindo-nos do Tribunal do Whatsapp, uma das perguntas que me fizeram,
sobretudo durante conversa num grupo desse aplicativo, quando abordávamos a
inexistência de constrangimento (em sentido penal) na situação à qual a mulher
foi exposta, fora a seguinte: “você diz que a mulher não foi constrangida e eu
acho isso um absurdo! Só pensa assim porque não foi com a sua filha. A reação
seria outra. E se fosse com a sua filha?” Meus amigos, se fosse com minha
filha, possivelmente eu estaria discutindo os limites da pena capital, da pena
de morte. Logicamente pensaria em punições mais dolorosas e severas e, quiçá,
desumanas. A lesão provocada em um ente querido provocaria em mim os instintos
mais primitivos. Isto se dá pois a vítima tem de ter a sua dor respeitada. Um
dos sentimentos humanos mais naturais é o desejo por vingança, apesar de sua
nocividade. Segundo os psicólogos, a vingança traz um alento, por conta da
compensação da dor sofrida pela dor causada, apesar de não contribuir para a
paz interior. Mas a pergunta poderia ter sido outra: se o meu filho fosse o
agressor? Certamente iniciaria discussão insistindo na possibilidade do perdão.
Argumentaria que o erro cometido por ele não é tão grave assim. Afinal, ele não
se utilizou de violência física ou grave ameaça. A vítima não sofreu um só
arranhão. De tantos os crimes que chocam a sociedade, como mortes cruelmente
provocadas e desvios de dinheiro público por quem tem boa condição financeira,
o fato acima não é tão reprovável e merecedor de pena de prisão e tamanha
ojeriza social. É interessante a mudança dos argumentos conforme a posição de
quem os defenda. As respostas mudam completamente. Defender a vítima é o oposto
de defender o ofensor. Num momento como o nosso, cujo império é o do ódio e da
intolerância, e a palavra respeito vem perdendo espaço para os piores
preconceitos possíveis, muitos se sentem mais vítimas do que a própria vítima. E
por falar em respeito, o Estado é pródigo em desrespeitar direitos mínimos do
cidadão. Não pode ele se achar vítima de todas as infrações criminais, sob pena
de perder a necessária isenção e abrir caminho aos abusos já conhecidos. Portanto,
jamais poderemos buscar a solução dos conflitos sob a perspectiva da vítima ou
do agressor. No mínimo se fossemos dotados do poder de julgar, deveríamos nos
colocar no lugar de ambos, para alcançar o justo resultado. Um bom julgador
deve pautar-se por manter o equilíbrio e a obediência das regras do jogo. No
momento em que vivemos, no qual muitos clamam por mais penas, mais presídios e
mais presos, está cada vez mais difícil falar em paz, tranquilidade e respeito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente no blog do Val Cabral.