Digo e não peço segredo, sabem os que me conhecem: tenho orgulho de ser itabunense, de ter sido feito gente no bairro Conceição, às margens do rio Cachoeira, contemplando os imensos cacauais das fazendas do Ribeirão dos Cachorros, onde meu saudoso avô Jacinto possuía uma roça de tamanho médio. Nos muitos invernos que a minha infância testemunhou – “mês de junho, com chuva e céu nublado”, como eu disse num artigo – aprendi a admirar a força da natureza, que estrondava em trovões e iluminava em relâmpagos faiscantes, espetáculo precioso que nunca mais se apagou das minhas retinas fatigadas.
Quem se cria no
interior leva consigo, vida afora, as marcas benéficas do aprendizado que
somente as cidades pequenas são capazes de proporcionar. Há todo um conjunto de
circunstâncias que, somadas umas às outras, constituem um riquíssimo mosaico
capaz de compor, em grande parte, a personalidade dos que ali dão os primeiros
passos da sua existência.
A capital
oferecia aos da minha época a tecnologia, a chance de progredir, a sedução do
que havia de mais moderno e avançado; mas somente as ruas da cidade natal, que
acolhem os nossos passos indecisos e vacilantes de criança, conseguem nos dar o
prumo necessário para seguir em frente nos muitos caminhos que a vida há de nos
oferecer. Saímos da nossa terra, mas ela não sai de nós, segue grudada em nossa
alma como uma tatuagem inapagável.
O grande e
saudoso Belchior, cantou que era “apenas um rapaz latino-americano, sem
dinheiro no bolso, sem parentes importantes e vindo do interior”. Esse também
fui eu. Quando cheguei a Salvador, mal entrado na adolescência, as largas e
extensas avenidas punham-se diante de mim como uma pista olímpica a ser
vencida. Os garotos com as suas gírias, as meninas com os seus salamaleques, os
professores com a sua pouca intimidade, tão diferentes das “tias” que eu
deixara para trás, o barulho, a correria, a pressa e a pressão – tudo me
parecia demasiadamente grande e dificultoso.
No silêncio dos meus temores e das minhas angústias, aprendi a sobreviver. Mas jamais deixei de ser quem eu era de verdade, somente um menino espantado e boquiaberto diante do vasto mundo que precisava ser compreendido e explorado.
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