As disputas para governos estaduais em 2022 devem ser marcadas por palanques fragmentados, traições e jogo duplo em relação ao cenário nacional. Longe de replicar a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), as principais pré-candidaturas a governador terão coligações amplas, palanques abertos e, em alguns casos, apoios a mais de um presidenciável.
As costuras variam de estado para estado e
devem levar em conta a competitividade dos candidatos em nível local e a
popularidade dos presidenciáveis em cada região. Com pré-candidaturas
competitivas no Nordeste, PT e PSB devem receber apoio de legendas como o MDB e
partidos do centrão como PP, PL e Republicanos.
O PP, por exemplo, deve seguir aliado ao PT na
Bahia e ao PSB em Pernambuco. O cenário não deve mudar nem mesmo com a possível
filiação de Bolsonaro ao PP, movimento que voltou a ganhar força na última
semana. "Essa [eventual] filiação dele não afeta de forma nenhuma em
Pernambuco, porque temos diretórios constituídos nos estados. A direção
nacional do PP respeita a autonomia das direções locais", disse o deputado
federal Eduardo da Fonte (PP-PE).
Em alguns casos, como o do PSB de Pernambuco,
a coalizão deve incluir no mesmo palanque petistas, adeptos da terceira via e
até mesmo apoiadores de Bolsonaro. A lógica de palanques aberto deve guiar as
candidaturas do PSD, que deve lançar candidatos nos três maiores colégios
eleitorais. O presidente nacional do partido, Gilberto Kassab, quer lançar o
senador Rodrigo Pacheco (DEM), como candidato a presidente pelo PSD. Mas não
haverá portas fechadas nos palanques estaduais.
Em Minas Gerais, por exemplo, o palanque do
prefeito de Belo Horizonte e potencial candidato ao governo Alexandre Kalil
(PSD) deve ter espaço para o PDT de Ciro Gomes e pode trazer até mesmo o PT de
Lula. O governador de Minas Romeu Zema (Novo), por sua vez, deve apoiar
formalmente o candidato a presidente do seu partido, ainda não escolhido, mas
terá em seu palanque bolsonaristas e tucanos.
O formato do palanque múltiplo deve se
replicar também em São Paulo, onde o PSD quer lançar Geraldo Alckmin e negocia
alianças com o MDB de Paulo Skaf e o PSB de Márcio França. Em estados como
Santa Catarina e Paraná, o partido deve ter candidaturas mais próximas ao
bolsonarismo, enquanto no Nordeste a tendência é de apoio a candidatos do PT e
PSB.
O PDT de Ciro Gomes e a União Brasil, que
surgiu após fusão do DEM com o PSL, devem firmar pontes em pelo menos quatro
estados: Goiás, Mato Grosso, Bahia e Pernambuco. Em Goiás e Mato Grosso,
estados com economia ancorada no agronegócio, a tendência é de palanques amplos
com espaço para Ciro, para nomes da terceira via e bolsonaristas. Em Goiás, o
governador Ronaldo Caiado (DEM) é favorito para a reeleição, mas terá que
enfrentar candidaturas ainda mais ancoradas no bolsonarismo, caso do empresário
Jânio Darrot (Patriota).
Na Bahia e Pernambuco, os candidatos do DEM
tentam se distanciar de Bolsonaro, que tem alta rejeição na região. Pré-candidato
ao governo da Bahia, ACM Neto tem percorrido o interior do estado fazendo
críticas aos 16 anos de governos do PT da Bahia, ao mesmo tempo que tenta
mostrar sua desaprovação em relação à forma de governar de Bolsonaro. Os
petistas, por sua vez, fazem o caminho inverso e tentam carimbar ACM Neto como
bolsonarista e aliado do presidente.
O cenário é semelhante em Pernambuco, onde o
prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (DEM), iniciou um movimento de
distanciamento do bolsonarismo, mesmo sendo filho do líder do governo no
Senado, Fernando Bezerra. Miguel quer abrir espaço no seu palanque para
presidenciáveis como Ciro e João Doria ou Eduardo Leite, que disputam as
prévias do PSDB.
A aliança com DEM e PDT em Pernambuco,
contudo, dependerá do desenho do cenário nacional. Mas tende a se consolidar
caso o PSB apoie a Lula na eleição presidencial. "Da nossa parte,
manteremos a parceria com o PSB de Pernambuco caso eles apoiem Ciro. Se
decidirem por outro caminho, temos um bom diálogo com Miguel Coelho",
afirma o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi. Além de se aproximar do DEM,
o PDT também deve fazer composições com o PT, mesmo frente às fagulhas entre
Lula e Ciro Gomes.
No Ceará, berço político de Ciro, uma nova
aliança entre os dois partidos pode resultar no apoio ao ex-prefeito de
Fortaleza Roberto Cláudio, do PDT. A parceria pode se replicar no Maranhão,
onde petistas defendem o nome do senador Weverton Rocha (PDT) para a sucessão
de Flávio Dino (PSB) em detrimento do vice-governador Carlos Brandão (PSDB),
apoiado pelo governador.
PT e PDT também podem dividir o palanque no
Amapá em torno da candidatura do senador Randolfe Rodrigues (Rede) a
governador. A composição é defendida pela direção nacional pedetista, mas
enfrenta resistência do governador Waldez Góes (PDT). Candidatos de MDB e PSDB
também devem contar com palanques heterodoxos, unindo de ciristas a
bolsonaristas. No Pará, o governador Helder Barbalho (MDB) deve concorrer à
reeleição com um dos palanques mais amplos do país, unido o apoio do PT e de
aliados de Bolsonaro.
Em Mato Grosso do Sul, o secretário estadual Eduardo
Riedel (PSDB), candidato à sucessão do governador Reinaldo Azambuja, trabalha
para trazer para o seu palanque bolsonaristas e antibolsonaristas. A ministra
da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), é cotada para ser a candidata ao Senado
na chapa. Mas os tucanos também trabalham por uma aliança com PSD do senador
Nelsinho Trad, do prefeito Marquinhos Trad e do deputado Fábio Trad, crítico
ferrenho de Bolsonaro na Câmara.
Em apenas um estado, o Piauí, a eleição deve
ser polarizada entre um candidato petista e uma bolsonarista. O PT, que governa
o estado desde 2015, lançará o secretário da Fazenda, Rafael Fonteles, para a
sucessão do governador Wellington Dias. Do outro lado, a candidata do campo
bolsonarista será a deputada federal Iracema Portella (PP), ex-mulher do
ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP).
Elton Gomes, doutor em Ciência Política pela
Universidade Federal de Pernambuco, destaca que as eleições estaduais seguem
lógicas próprias. "O país é continental, com muitas realidades locais
diferentes. E o exercício do poder passa por muitas construções contextuais e
factuais distintas, onde em cada estado da federação existe uma competição
entre diferentes grupos", afirma.
O especialista ainda avalia que a próxima eleição deve ser mais descolada das eleições estaduais, ao contrário de 2018, quando parte dos governadores se elegeu na onda bolsonarista.
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