Pior do que os que fazem fofoca, só os que param para ouvi-las |
Meu
amigo Gofredo achava que tinha encontrado o amor de sua vida. Tereza, dizia
ele, era perfeita. Repórter de um grande jornal da capital da Bahia, Salvador.
Bonita, loira de cabelos que escorriam quase até a cintura, libidinosamente
petulante, inteligente. Falava de Paulo Coelho, de Ciro de Matos e de artes
marciais, e não recusava qualquer conversa de bacharel. Piercing no seio, que
ela dizia deixá-la em estado de contínua excitação, tatuagem de golfinho na
virilha esquerda. Tudo bem que Gofredo é uma gangorra sentimental, sempre à
procura da mulher perfeita, mas sua descrição de Tereza me fez acreditar que
aquela história duraria pelo menos algumas semanas. Não durou mais que dez
dias. Quando Gofredo me disse por que tinha demitido de sua vida uma mulher tão
sensacional como Tereza, vi que ele tinha toda razão. Tereza era a Mulher
Tagarela. Um homem suporta muitas coisas. Dor de dente, congestionamento,
jogadores mercenários. Pedágios que se multiplicam, Claudia Leitte e Ivete
Sangalo, o mosquito da dengue. Filas. Sogras, juízes de futebol, supermercados
sábado pela manhã. É incrível a resistência do homem às calamidades. O que não
dá para suportar é a Mulher Tagarela. Tereza, me disse Gofredo, era uma Mulher
Tagarela. Seu assunto favorito, como sempre acontece nesses casos, era ela
mesma. Tereza se julgava uma eterna manchete. Contava suas histórias com entusiasmo
barulhento. Seus olhos se arregalavam ao falar de si própria. Não havia pausa,
não havia brechas pelas quais o pobre Gofredo conseguisse deter o vulcão
verborrágico da loira espetacular. “Tudo bem que a mulher fale antes e depois
do sexo”, me disse Gofredo em sua estupefação tola. “Mas durante fica difícil.
Não estou falando de conversa sexual. Ela me contava coisas como o elogio que
tinha recebido do chefe, e de como tinha sido merecido. Uma vez ela me falou
como tinha roubado o namorado rico e poderoso de sua irmã. Uma outra vez ela
abriu os olhos subitamente e me disse se podia me fazer uma pergunta. Eu disse
sim, e ela perguntou se eu podia trocar o pneu furado do carro dela. O pior é
que troquei imediatamente.” A Mulher Tagarela não tem limites. Simplesmente
detesta ouvir. Depois de escassos segundos de aparente atenção, você nota em
seus olhos dispersos que ela não está ouvindo. Seus pensamentos estão na
verdade voando em torno dela mesma. Nada do que você faz é capaz de prender o
interesse da Mulher Tagarela. Por isso ela não tem amigas e nem amigos. É amiga
apenas de si mesma. Gofredo é um jornalista aspirante a escritor. Contou
empolgado a Tereza que uma editora de livros tinha decidido publicar o seu
primeiro romance. O primeiro romance publicado de um aspirante a escritor é
mais importante que o primeiro sexo ou que a primeira vez que dirige um carro.
Ela bocejou e pediu a ele que fosse buscar um copo de água para ela. Metade
gelada, metade natural. Estava com sede. Foi quando Gofredo desistiu. Não sem
antes, é verdade, ter providenciado o copo sob medida de água para Tereza. Gofredo
queria o básico. Nada além do básico. “Ela não precisava nem ler o manuscrito”,
ele me disse. “Bastava pedir uma cópia e depois dizer que tinha achado alguns
trechos legais.” Nos poucos dias em que estiveram juntos, Gofredo conheceu
compulsoriamente toda a história de Tereza. Detalhes em geral pouco animadores
de seus namorados passados. João Paulo falhara algumas vezes. Lúcio tinha
ejaculação precoce e se recusava a enfrentar a verdade e procurar um médico.
Danilo Góis gostava de vê-la com fantasias sexuais na cama. Edu, com certeza,
não escovava os dentes. Otávio nunca tinha lido um livro, era um burro. Bruno
achava que Sergio Leone era um jogador de futebol do Milan. A Mulher Tagarela
só tem palavras positivas para ela mesma. Nem com piercing no mamilo se salva. Apenas
uma espécie se compara a ela. É o Homem Tagarela.
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