Drª Rita Arcanjo é referência do quanto é raro uma grande e verdadeira amizade neste mundo desarmonioso e mercantilista |
Tornou-se cada vez mais costumeiro ouvir de um e outro que não se faz
mais amigo como antigamente. E com toda razão. Não só não se faz mais amigos
como outrora como se tornou raridade encontrar alguém com as características de
verdadeiro amigo. Tornou-se tão difícil que numa hora de precisão um bom tempo
é despendido para lembrar um só nome. E ainda assim sem a certeza da acolhida
tão urgente e necessária. Quais são as características de um verdadeiro amigo,
alguém poderia indagar. Nada que assombre a ideia. Pelo contrário, apenas o
reconhecimento do outro não apenas no instante de necessidade maior, mas em
todos os momentos da existência. Em outras palavras, ter a certeza de não estar
desamparado, sozinho, que pode contar com alguém. E não somente para ser
auxiliado, receber apoio, mas para compartilhar o prazer do encontro, do convívio,
do instante acompanhado de café com palavras. O amigo faz falta não porque
esteja ausente num momento de precisão ou porque desconhece a amizade quando
dele mais necessita, e sim por estar presente na recordação e no afeto e não
ser encontrado no dia a dia e nos acasos da vida. O amigo, ou aquele em que se
confia a amizade, vive na lembrança e não em pensamentos ocasionais, permanece
no coração e não apenas como número de telefone ou nome de agenda. Por confiar,
cria-se a sensação de segurança e de presença. A verdadeira amizade é bondosa e
altruísta, é solidária e humilde, é compreensiva e sincera, e um amigo assim é
sempre essencial na vida de qualquer um de igual pensamento. Por isso mesmo que
se mostra difícil encontrar pessoas com tais características nos dias atuais, e
estes tão cheios de vaidades, soberbas, egoísmos e isolamentos. Com efeito, o
mundo atual é formado por pessoas que se tornam estranhas aos conhecidos e
familiares, por viventes que buscam refúgio em ilhas cercadas de gente por todos
os lados. As ilhas humanas demonstram bem como o ser está cada vez mais
sozinho. Pessoas que evitam pessoas, que as olham com desconfiança e até
arrogância, seres que se presumem capazes de tudo na sua solidão premeditada.
Verdade que surpresas desagradáveis fazem evitar até pessoas mais íntimas,
porém nada justifica a descrença no próximo, o isolamento como se ninguém mais
merecesse confiança e a construção de uma amizade sincera. Por consequência, as
ilhas proliferam separando aqueles que estão lado a lado. Ou o homem acredita
no homem ou o convívio terreno ficará cada vez mais insustentável. Porque já
suportou uma falsidade de quem não esperava que cometesse, muitas vezes a
pessoa acaba evitando ir além de um tratamento distante e frio. Mas é preciso conhecer
as pessoas, será preciso uma maior aproximação para apreciar suas virtudes,
seus modos, o que as guarnecem positivamente. E de repente, naquele que nem se
mostra além da sinceridade estará alguém que pode ser confiado, compartilhado,
acreditado. Um amigo. A amizade não se constrói nem se sustenta com escusas
intenções, e muito menos perdura com fingimentos e falsidades. Até que um possa
ser enganado por algum tempo, vez que aquele de bom coração insiste em não
acreditar na maldade do outro, mas quando a verdade estabelece a realidade dos
fatos, então será o farsante que amargará a solidão e o desprezo, sentirá no
íntimo a falta que faz não poder contar com alguém que ao menos lhe diga o
quanto andou errado. A verdade é que, demonstre ou não, todo mundo deseja um
amigo, e quanto mais verdadeiro melhor. Diante de uma doença, muita gente sofre
pelo enfermo como se ao lado de uma pessoa amada, guardando-lhe a cabeceira,
fazendo orações, providenciando o que for possível para amenizar a
desesperadora situação. No meio da noite, diante de qualquer ocorrência, ao
bater à porta é que se reconhece a verdadeira amizade. O bom amigo não só abre
a porta como serve no que estiver ao alcance. Na ausência do amigo, somente
aquele que lhe guarda carinho e afeição faz a defesa sincera e justa perante
línguas ferinas. Também é amigo aquele da canção, guardado no lado esquerdo do
peito. Ou o outro que chora sua dor sobre o ombro daquele que desde muito não
encontrava. Amigo é pra essas coisas, diz a música. Não só para essas coisas
como para muito mais, pois a verdadeira amizade possui a firmeza do diamante e
o valor inestimável da própria vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente no blog do Val Cabral.