O Hblem opera, em média, 8 motoqueiros acidentados em Itabuna |
Bati meu triste recorde: em um só
dia, há cerca de duas semanas, eu vi três acidentes de motos. Todos muito
feios. Um “flagrante” que eu dispensaria de bom grado. Essa é uma realidade
diária em Itabuna e generalizada pelo país, constatada e comprovada pelos
números do Ministério da Saúde, através dos chocantes dados do SIM (Sistema de
Informações de Mortalidade). Segundo informações do Dr. José Henrique Carvalho,
apenas no Hospital de Base Luiz Eduardo Magalhães (Hblem), oito motoqueiros,
em média, são acidentados em
Itabuna. É uma tragédia cotidiana com a qual nos acostumamos. Assim como a
morte de uma meninada pobre e sem sonhos, que não os imediatos – o consumo
drogas é o mais comum -, que continua a me incomodar terrivelmente. E o que
dizem os números do SIM? Que os acidentes com motos e mortes no Brasil
cresceram 263,5% em dez anos. O período analisado vai de 2001 a 2011. Uma
carnificina nas ruas e avenidas espalhadas pelo país. Foram 30.524 no primeiro
ano pesquisado. Chegaram a 42.425 dez anos depois. Um genocídio que só tem sido
potencializada pelos programas de redução dos tributos para alguns setores
industriais e a farta oferta de crédito “fácil’ para os que não têm – até
porque parecem não existir a “olho nu” – uma alternativa que não a moto. Porque
o serviço de transporte coletivo é imprestável em todo o Brasil (é só ver a
revolta com o aumento do preço das passagens de ônibus nas nossas cidades);
porque a moto se apresenta como a melhor possibilidade de alguma renda para os
sem-emprego. A maioria das vítimas se situa entre os 18 e 30 anos de idade.
Eles são pobres – era óbvio demais-, e a metade usa a moto como transporte. O
aumento das mortes é proporcional ao crescimento das motos: foi de 300% no
mesmo período estudado. Os culpados imediatos são muitos. Todos somos
mal-educados, intolerantes e agressivos no trânsito, e não cabe apontar o dedo
exclusivamente para a turma que anda sobre duas rodas. Parece-me, porém, que há
uma lógica perversa para atender ao “sonho” dos que querem, também, ser
possuidores de um veículo motorizado. Na prática, estamos combatendo o
subemprego e a falta de políticas sérias para o transporte coletivo com a
morte. Simples assim. De repente, e não mais que de repente, o Brasil teria
descoberto o caminho da imortalidade – que continua impossível para todos. Esta
é apenas uma parte do problema. O governo gasta mais de R$ 100 milhões com o
atendimento e recuperação dos acidentados: próteses, fisioterapia e atenção
psicológica. Para muitos é a morte em vida, a incapacitação para o trabalho que
já não tinham. O sonho se vai no sangue que se esvai no asfalto. Uma realidade
incontestável: os que se habilitam mal para guiar uma moto, com a complacência
dos Detrans, nunca acham que correm riscos ao se enfiar entre os carros, ônibus
e caminhões em manobras perigosas. Agem como se estivessem movidos por uma fé
insana, semelhante, se me permitem a analogia, aos fundamentalistas religiosos
de todos os matizes. O vazio da alma se preenche com o terror urbano – no nosso
caso. Os mortos nessa guerra insana – como todas as guerras –, entretanto, não
terão a esperá-los 70 virgens no paraíso eterno. Ainda que não possamos
descartar que o “inferno” pode estar mesmo do lado de cá: para as mães que
choram seus filhos ausentes, para os filhos que serão criados sem a presença
dos pais.
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