Todos os dias, Agenor pega o ônibus na mesma rua para ir trabalhar. Enquanto espera e durante todo o trajeto, fica a observar as pessoas e os
lugares. Outro dia, viu aproximar um casal de cegos. Eles estavam de mãos dadas e, num primeiro momento, passavam uma imagem positiva, de que o amor é possível em qualquer situação. Mas, quando ao seu lado estavam, a história se inverteu completamente. O homem, em seus 20 e muitos anos, falava palavras horríveis, xingando a vida e reclamando, de forma rude, pelo fato de ser cego. Ao seu lado, a namorada, com uma aliança de prata no dedo, apenas ria do acontecido, como se fosse algo normal estar tão revoltado e infeliz. Todos, no ponto de ônibus, estavam incomodados com o homem e os poucos minutos que por lá ele permaneceu pareciam intermináveis. Ajudados por uma gentil senhora, o casal pegou a lotação pela qual esperavam e partiu. O clima, já pesado pelo mau humor do deficiente, se tornou mais leve. Para um senhor que estava no banco, faltava Deus no coração. Agenor achou que, antes de tudo, faltava um coração para Deus entrar e ficou pensando como ele se lamentava e de uma forma tão estúpida. Agenor sabia que não dava para imaginar o sofrimento e as necessidades que um cego passa. É fácil julgar estando fora da situação, mas a forma como ele enfrenta a vida faz com que tudo se torne pior. Eis que o seu ônibus passa e ele, que naquele momento agradecia a Deus pela sua visão, deseja não enxergar o que estava à sua frente. Era um velhinho, cabelos brancos, pele enrugada, uma roupa simples e um tênis de cada cor. Ele puxava um carrinho de catar papel com toda a dificuldade que sua idade impõe. E, para completar, o sol estava muito quente. O idoso fazia uma enorme força e, depois de arrastar o carrinho por alguns metros, balançou a cabeça em sinal de reprovação, lamento. De uma forma mais sutil, o velhinho também se revoltava com o destino, com a vida, mas seguia em frente. Neste momento Agenor preferiu não ter a visão. Não uma cegueira da discriminação e do esquecimento. Não para negar o fato. Ele gostaria de não enxergar essas situações por saber que não existem. Os mesmos olhos que permitiam que a luz do sol enchesse de calor o coração, também levam a escuridão e tristeza ao se comover com um pobre velhinho. E o pior é saber que, como esse, existem muitos outros, trabalhando em uma idade que deveriam estar descansando e curtindo os netos, colhendo os frutos de uma vida inteira de luta.
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As pessoas acima de 60 anos neste país são excluídas, marginalizadas,isoladas. Parece que depois dos 60 as pessoas perdem os direitos. A sociedade não aceita o velho e cultua o mito da eterna juventude. Alguns ainda pensam que o idoso é um estorno.
ResponderExcluirSeria muito salutar que tivéssemos nas escolas uma disciplina relacionada ao envelhecimento; passar noções gerais sobre isso no Encino Fundamental. Começaria aí uma nova cultura de valorizar e respeitar o idoso, de promover um relacionamento sem preconceitos entre as diferentes gerações, cada uma compartilhando suas riquezas e valores.
ResponderExcluirO que fazer com esta população de idosos e como proporcionar uma vida mais digna para eles?
ResponderExcluirPrecisamos de políticas públicas para a dignidade desta faixa etária.