Marcelo Cerqueira é Presidente do Grupo Gay da Bahia |
A Câmara Municipal
de Salvador aprovou em 3 de março desse ano o projeto do vereador Aleluia
Junior, que institui no município a “Escola sem partido”. O projeto original é
de autoria do deputado baiano Erivelton Santana, antes do PSC agora PEN-BA,
registrado PL 7180/14, que tenta alterar ilegalmente a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB – 9.394/96), obrigando as escolas a proibir temas
históricos, sociológicos e filosóficos que defendam a democracia, a liberdade
de opinião e o respeito à diversidade, seja étnico-racial, religiosa ou de
orientação sexual, com o falso discurso de respeitar as convicções do aluno, de
seus pais ou responsáveis. O projeto está em tramitação e no dia 30 de maio
ouviu na Comissão Especial Sra. Heloisa Oliveira, da Fundação Abrinq, para
debater o tema Escola sem Partido neste Colegiado. Este projeto de Lei, que
confunde de forma tendenciosa o seu nome afirmando ser contra os partidos
políticos considerados de esquerda, afirma que estes partidos ou outros
estariam operando de forma orgânica junto às escolas e desse modo influenciando
os alunos em tendências políticas, se não fosse perigoso seria risível.
Acreditar que os professores são um exército de doutrinação e que estão mudando
a ideologia dos alunos é desconhecer a realidade das escolas, dos professores e
da própria juventude, e quem foi jovem desde a década de 1960 sabe que os
valores são formados por muitas experiências e os professores e suas escolas
não têm o poder de doutrinar ninguém, eles apenas participam de um turbilhão de
informação e subjetividades que envolvem a família, os grupos de amigos, a
mídia, a internet, os espaços religiosos, os movimentos sociais. Isso é uma
mentira. O Projeto “Escola sem partido” esconde uma grande cilada para toda a
sociedade, porque pensa de forma premeditada o processo de educação de forma
retilínea e moralista, sem pensar na diversidade, coloca mordaça no professor e
no processo de Educação. Escola sem partido é escola com mordaça! Escola sem
partido é reflexo da onda de conservadorismo, a mesma que na África proíbe
distribuir preservativo, não obstante a população esteja sendo eliminada por
doenças, porque não existe liberdade de expressão no processo educacional onde
se proíbe tratar de assuntos ligados às sexualidades. Esse pensamento, que tem
fortes representantes midiáticos e religiosos no Brasil, é o responsável pela
proliferação da AIDS, pela gravidez na adolescência, pela violência contra a
mulher, pelo machismo, pela perseguição à comunidade LGBT, destruindo a
liberdade do sujeito. A liberdade de expressão foi uma conquista para toda
humanidade, uma luta cara, onde muitos pagaram com suas vidas o preço dessa
liberdade. Durante mais de duas décadas o movimento social no Brasil foi
generoso, contribuindo com os órgãos públicos propondo políticas públicas que
incidissem nas questões de saúde, trabalho e na Educação não foi diferente.
Pegamos o real social e transformamos em políticas públicas, contribuímos de
forma generosa para a Educação com o discurso de gênero, diversidade, raça,
geração, classe social, Tudo isso foram contribuições de nossas lutas que
incidiram nas políticas e na educação em especial. Não é possível existir uma
escola sem que o aluno seja preparado para a vida e para conviver com um mundo
que apesar de redondo, possui esquinas, curvas, buracos e becos sem saída. Não
é possível que o aluno do gênero masculino aprenda a respeitar mulher, a diversidade
de gêneros, criança e idoso se isso não for tema da transversalidade da escola.
Não é possível formar cidadãos completos sem ensinar o que é respeito, sem
ensinar a falar obrigado, por favor, sem respeitar professor, sem ensinar o
conhecimento das humanidades. Talvez você crie antipatia a esse tema por eu ser
homossexual, mas esse tema não é restrito à comunidade LGBT, esse tema incide
por exemplo nas ações do SUS – Sistema Único de Saúde junto a juventude, e o
SUS paga por essa ausência na Educação. A Escola Sem Partido, projeto nacional
na Bahia defendido por segmentos fundamentalistas e conservadores, é na verdade
a Escola com um partido, o deles, que quer impor nas escolas seus princípios e
forma de agir, sentir, pensar e interpretar o mundo. O projeto quer amordaçar o
professor no seu oficio que é de ensinar, e desqualifica a autoridade e
liberdade do professor em sala de aula ao estabelecer que os alunos devem
denunciar profissionais e processá-los na Justiça. Esse projeto já foi considerado
inconstitucional pelo STF, equivocado, tendencioso e conservador de direita por
todas as associações científicas educacionais, e é o oposto do nosso Plano
Nacional de Educação aprovado em 2014 (Lei 13.005/2014), esse sim debatido com
todos os setores da sociedade. O PNE que tentam hoje desfigurar institui que o
ensino deve combater toda forma de intolerância e fundamentalismo e estimular
as crianças e jovens a viver numa sociedade plural e democrática. A escola sem
partido, é uma ofensa à profissão de professor, a homens e mulheres que
dedicaram vidas à Educação. Aproprie-se do tema, diga não à essa deformação.
Escola não deve ter mordaça, escola é local de construção do conhecimento e
este é amplo, diversificado, leva em consideração todos os elementos que
compõem o povo brasileiro, não apenas um. Por Marcelo Cerqueira, Presidente do
Grupo Gay da Bahia, licenciado em História pela UCsal.
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