Os requerimentos de instalação de CPI para investigar o escândalo do INSS e para acelerar a votação do projeto de anistia ao 8 de janeiro mostram abertamente o real tamanho da oposição a Lula (PT) dentro do bloco de centro e de direita que formalmente o apoia. Apesar de comandarem 11 ministérios, União Brasil, PSD, MDB, PP e Republicanos tiveram em média 40% de suas bancadas na Câmara apoiando as duas medidas que, nos bastidores, contrariam os interesses do Palácio do Planalto.
O
União Brasil é o que mais concentra infiéis: 60% da bancada. É seguido por
Republicanos (45%) e PP (43%). O PSD de Gilberto Kassab (31%) e o MDB de Baleia
Rossi (27%) são os que se colocaram mais alinhados ao governo. Esses três
requerimentos —um da anistia, um de CPI e outro de CPI mista do INSS—
representam um importante termômetro dessa base aberta de oposição a Lula entre
esses aliados porque, além de serem atuais, são temas em que o centrão não se
moveu organicamente para o lado da oposição.
Ou
seja, fica mais evidente a lista de parlamentares desses partidos que
frequentemente votam contra o governo, o que não é possível de se medir quando
há uma aliança em bloco entre centrão e oposição. Os três requerimentos ajudam
a explicar com números a situação instável que Lula vive no Congresso. No
papel, sua base de sustentação é robusta: ele conta com 125 deputados de
esquerda, seu núcleo mais fiel, além de 242 do quinteto de centro e direita,
totalizando 367 deputados — o que representa mais de 70% das cadeiras da Câmara
e seria suficiente para aprovar com folga emendas à Constituição.
A vida
do petista na Câmara, porém, tem se mostrado muito mais atribulada. Os
requerimentos de CPI e da anistia mostram que, dos 242 parlamentares desses
cinco partidos, 101 apoiaram abertamente ambos e, de fato, são políticos que
atuam em sua maioria abertamente em oposição a Lula. Com isso, a base real do
petista na Câmara cai a 265, pouco mais da metade das 513 cadeiras, número
muito mais suscetível a solavancos. O União Brasil tem na figura do presidente
do Senado, Davi Alcolumbre (AP), o principal elo com o Planalto e controla três
ministérios — Integração, Turismo e Comunicações.
O
histórico do partido, que remonta à legenda de apoio à ditadura militar, e o
mapa de sua configuração mostram um cenário bem adverso a Lula, porém. O União
Brasil protagonizou, por exemplo, o episódio do quase-ministro Pedro Lucas
Fernandes, que aceitou o convite para Comunicações e depois o rejeitou após
conflagração na bancada. A lista de apoio tanto à CPI do INSS quanto à urgência
da votação do projeto de anistia mostra nomes como Dani Cunha (RJ), Dayany
Bittencourt (CE), Kim Kataguiri (SP), Mendonça Filho (PE) e Rosangela Moro
(SP), críticos abertos de Lula, entre vários outros.
A
situação no Senado não é melhor, apesar de Alcolumbre. Dos 7 senadores da
legenda, 4 assinaram o requerimento de CPI mista para o caso do INSS: Sergio
Moro (PR), Marcio Bittar (AC), Alan Rick (AC) e Jayme Campos (MT). O partido
está em processo de montagem de uma federação com o PP (um ministério,
Esportes), que protagonizaram evento de lançamento no Congresso assemelhado a
um comício de oposição. O PP que também registra alto índice de infidelidade
aberta a Lula, tendo à frente nomes como Delegado da Cunha (SP), Evair de Melo
(ES) e Pedro Lupion (PR).
O
Republicanos, que comanda a Câmara com Hugo Motta (PB), tem um ministério, o de
Portos e Aeroportos, mas também figura em grande presença na lista dos
requerimentos —45% da bancada em ambos. Entre os aliados de centro e de direita
de Lula, MDB e PSD seguem tendo um maior alinhamento, apesar de também terem em
torno de um terço da bancada conflagrada contra o Palácio do Planalto. São
desses dois partidos, por exemplo, os deputados Delegado Palumbo (MDB-SP),
Osmar Terra (MDB-RS), Gilberto Nascimento (PSD-SP), Reinhold Stephanes Jr.
(PSD-PR) e Sargento Fahur (PSD-PR), notórios antigovernistas.
Como
mostrou a Folha, em menos de um mês o governo sofreu oito reveses vindos de sua
base formal de apoio, entre eles os requerimentos e a aprovação pela Câmara de
projeto que visava suspender ação penal da trama golpista. Esse último episódio
foi um exemplo de aliança em bloco do centrão com a oposição, situações em que
a esquerda fica isolada e é derrotada por ampla maioria — no caso, 315 votos a
143.
Lula venceu a eleição de 2022 por uma margem apertada
e, de quebra, viu os partidos de centro e direita conquistarem a maioria na
Câmara e no Senado. Diante disso, ainda durante a transição costurou uma
aliança com o centrão articulada por Arthur Lira (PP-AL), então presidente da
Câmara e recém-saído do palanque de Bolsonaro. Mesmo após ceder nove
ministérios a essas siglas — número que mais tarde subiria para 11 —, desde
2023 acumula episódios de infidelidade política.
Diferente de gestões passadas, quando os governos petistas dispunham de maior popularidade e tinham mais instrumentos de controle sobre liberação de emendas, Lula hoje lida com uma esquerda fragilizada, aprovação popular claudicante e um Congresso fortalecido pela execução obrigatória e volumosa das emendas parlamentares.
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